ABA participa de Audiência Pública na Câmara dos Deputados, em Brasília, sobre Publicidade Infantil
Em 24 de maio de 2016, Sandra Martinelli, Presidente Executiva da ABA, participou da Audiência Pública na Câmara dos Deputados, em Brasília, que debateu o PL 702 de 2001, que “Altera a Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990, restringindo a veiculação de propaganda de produtos infantis”, em requerimento no 137, de 2015, dos deputados Luiza Erundina, Margarida Salomão e Roberto Alves.
Estiveram presentes Pedro Hartung, advogado da equipe do projeto Criança e Consumo do Instituto Alana; Fernando de Almeida Martins, Procurador da República em Minas Gerais; Profa. Inês Sílvia Vitorino Sampaio, da Universidade Federal do Ceará e coordenadora do grupo de Pesquisa da Relação Infância, Juventude e Mídia (Grim); Mariana Machado de Sá, cofundadora do Movimento Infância Livre de Consumismo (Milc); Gilberto Leifert, presidente do Conar; Dr. Paulo Gomes de Oliveira Filho, consultor jurídico da ABAP; Rodrigo de Medeiros Paiva, diretor de licenciamento da Maurício de Souza Produções; e Prof. Dr. Claudemir Edson Viana, secretário-executivo da Associação Brasileira de Pesquisadores e Profissionais de Educomunicação (ABPEducom).
Leia abaixo o discurso de Sandra, na íntegra:
Brasília, 24 de Maio de 2016.
À
Câmara dos Deputados
Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática/DECOM
Exmo. Sr. Presidente desta Comissão, Deputado Alexandre Leite
Exmo. Sr. Relator desta Comissão, Deputado Sandro Alex
Exmas. Sras. Deputada Luiza Erundina e Deputada Margarida Salomão, as quais cumprimento pela iniciativa da requisição da presente Audiência Pública, e demais integrantes desta Comissão
Ilustres Autoridades,
Minhas Senhoras e Senhores,
Em nome da ABA – Associação Brasileira de Anunciantes gostaria de agradecer pelo honroso convite dessa prestigiosa Comissão, que hoje promove importante debate público sobre o tema da publicidade infantil.
A presente audiência pública torna possível à ABA detalhar as razões que, a nosso ver, reforçam o entendimento de que o Brasil já detém uma legislação robusta e rigorosa sobre o tema da Publicidade Infantil, em conformidade com o arcabouço constitucional e com as mais atuais legislações do mundo.
A ABA foi fundada há mais de 50 anos para representar os interesses comuns dos anunciantes. Reunimos mais de 150 grandes anunciantes, que, JUNTOS, respondem por aproximadamente 70% dos investimentos em publicidade realizados no Brasil.
A ABA é igualmente filiada à WFA – World Federation of Advertisers, entidade que congrega associações de anunciantes de 57 países.
Nós nos orgulhamos de figurar como uma das fundadoras e integrantes do CONAR – Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária, que desde a década de 70 atua para impedir o abuso da publicidade, sobretudo, para crianças.
Nesse contexto, senhores, em relação ao tema da Publicidade Infantil, após diversas discussões e estudos posicionamo-nos, através de 6 (seis) pilares fundamentais:
1o) Defendemos a liberdade de expressão como valor maior e constitucionalmente protegido de uma sociedade livre e democrática.
2o) Repudiamos qualquer publicidade enganosa ou abusiva, sobretudo aquela que se aproveita da deficiência de julgamento e experiência da criança.
3o) Reprovamos qualquer iniciativa legislativa de banimento na publicidade, inclusive da publicidade infantil. Estamos certos de que isto fere os princípios basilares da Constituição Federal e trabalha em desfavor do desenvolvimento maior de toda nossa sociedade.
4o) Acreditamos na grande importância da educação e no papel central da família na orientação das suas crianças.
5o) Defendemos o desenvolvimento econômico sustentável. Acreditamos na importância de uma publicidade responsável, atenta à legislação vigente e aos valores maiores da sociedade brasileira.
6o) Acreditamos que a autorregulamentação é um caminho ágil e eficaz no controle e regulamentação de atividade tão marcada pelo dinamismo e inovação.
Pois bem. Seguindo esses pilares, viemos hoje à esta ilustre Comissão falar sobre o PL 702/11.
Trata-se de Projeto que objetiva proibir a veiculação de publicidade infantil nos canais de televisão aberta e fechada no período das 7:00 às 22:00hs.
Com o devido respeito, e como já fora observado anteriormente em outras comissões, trata-se, porém, de PL que não observa as garantias fundamentais da liberdade de expressão e informação.
O PL 702/11, na prática, representa o BANIMENTO da publicidade infantil televisiva, o que, permitimo-nos dizer, é inconstitucional, à luz dos artigos 170 e 220 da Constituição Federal, além de extremamente deletério ao desenvolvimento econômico e social do País.
Assim, gostaríamos de trazer algumas reflexões e importantes informações que contribuem para o debate aqui proposto:
1) A ABA tem a firme convicção de que a publicidade é parte indissociável de nosso mundo e uma importante fonte de inovação, competição e informação aos consumidores. Sabemos que a publicidade infantil é um tema de grande complexidade, mas não deve ser vista como a vilã.
Acreditamos, que é importante ensinarmos nossos filhos a falharem e a lidarem com as frustrações. E isso se aplica à eventual angústia de muitos pais ao dizerem não a seus filhos diante da solicitação de um produto.
Não é, portanto, retirando a publicidade do universo das crianças que as deixaremos livres ou mais seguras da sociedade de consumo.
Como diz o filósofo Mario Sérgio Cortella:
“Para alguns pais, ao deixar filhos em casa sem acesso aos meios digitais, a criança ficará protegida. Não, ela não ficará protegida, e sim, isolada, e se há uma coisa que deseduca, porque não prepara, é o isolamento”.
Alinhada com a posição da Federação Mundial dos Anunciantes – WFA, a ABA defende que a publicidade seja considerada uma aliada da sociedade, por exemplo, na promoção de hábitos mais saudáveis ou de comportamentos responsáveis.
2) Importante, ainda, trazer alguns dados de grande importância para a reflexão de todos sobre o tema ora em discussão:
- a) Estudo realizado pelo Ibope Media, a pedido do CONAR e ABA, mostra que a publicidade às crianças já é muito restrita.
Realizada no período do Natal de 2012 e janeiro de 2013, período intenso em propaganda, a pesquisa tinha como objetivo identificar o volume de comerciais de produtos infantis direcionados a criança e a seus pais[1].
O IBOPE identificou que, na TV aberta, apenas 0,5% das inserções publicitárias correspondem à publicidade infantil, e quando, analisado em programações com maior audiência infantil (i.e., 50% de audiência), este percentual cai para 0,1%. No caso de TV por assinatura, o volume de comerciais dirigidos às crianças, foi de 12%. Mesmo sendo percentual baixo, identificou-se que esse volume cai para 1,6%, após o Natal.
Ou seja, não foi identificado volume excessivo de mensagens comerciais dirigidas as crianças.
- b) Importante igualmente mencionar que o banimento da publicidade infantil certamente tornará ainda mais escassa a programação adequada às próprias crianças, as quais somente terão contato com programação adulta. Sem programação, conteúdo e publicidade própria, tal ambiente se agudizará ainda mais.
3) É ainda preciso desmistificar a suposta inexistência de regulamentação no Brasil e que outros países estariam muito à nossa frente.
No Brasil não faltam normas e direcionamento. Estudo realizado também em 2013, pela ABA em conjunto com o CONAR, mostra que o Brasil tem uma das mais rigorosas normas éticas sobre publicidade para crianças do mundo. Basta análise do rigoroso artigo 37 do Código de Autorregulamentação publicitária e seu anexo H, como bem demonstrado pelo CONAR.
A autorregulamentação está atenta às crianças, aprimorando suas regras e efetivando o controle de abuso.
4) Por último, e falando ainda sobre arcabouço normativo, a ABA entende que a legislação já existente – isto é, a Constituição Federal, o Código de Defesa do Consumidor e o Estatuto da Criança e do Adolescente – é legitima e traz ferramentas para um eficiente controle de eventuais abusos.
No que se refere à Constituição Federal, ela garante duplamente a proteção da publicidade.
A publicidade está protegida enquanto atividade de liberdade de expressão e informação de produtos e serviços disponíveis (artigos 5º, inciso X e 220 da Constituição Federal). Também há proteção por força do artigo 170, que resguarda a publicidade enquanto atividade econômica assegurada pelos princípios da livre iniciativa e livre concorrência.
No que tange à publicidade para crianças não houve proibição ou restrição constitucional à atividade.
Consoante o jurista Tercio Sampaio Ferraz Junior: “Supor que a proteção constitucional da criança signifique enfiá-la numa redoma de vedações é pensar que educar seja suprimir desejos, sublimar a inveja e anular o mundo em que se vive”.
Observando esse preceito constitucional, o nosso Código de Defesa do Consumidor, admitiu expressamente a publicidade infantil, reprovando apenas o abuso da capacidade da criança. A publicidade infantil está, assim, garantida também no artigo 37, § 2º do CDC que proíbe apenas a publicidade “(…) que se aproveita da deficiência de julgamento e experiência da criança (…).”
Por fim, e não menos importante, ressalte-se que medidas proibitivas como a do presente Projeto de Lei representam, de um lado, a total substituição do Estado ao próprio pátrio poder em matéria de publicidade infantil. De outro, como é de senso comum, “a família é o principal fator de influência nas crianças e jovens, depois dela vem a escola”.
Propor o banimento da publicidade infantil televisiva ou de qualquer outro meio é ferir a liberdade de expressão prevista na Constituição Federal, além de tentar achar um bode expiatório para temas multifatoriais.
Temos a forte convicção de que a proibição da publicidade infantil não será a solução dos problemas relacionados às crianças. Lidamos com a questão da criança seriamente, mas sob a ótica de uma sociedade democrática saudável e que tem a liberdade como pilar fundamental e depende da responsabilidade de seus diversos agentes.
Em uma sociedade como a nossa, é mesmo complexo acreditar que a criança não será atingida por outras mídias, sobretudo aquelas do mundo adulto. O caminho é, sem dúvida, educar e estimular o conhecimento e atuação parental.
Em suma: o PL 702/11 na forma proposta se mostra com o devido respeito inconstitucional, desproporcional e sem comprovado resultado prático ao fim a que se pretende. Respeitosamente, entendemos que a sua rejeição por esta Comissão deve ser o caminho natural.
Reafirmamos nosso compromisso com o combate a qualquer forma de publicidade que desrespeite a legislação e os princípios da autorregulamentação.
Muito obrigada!
Sandra Martinelli
Presidente Executiva
[1] Foram levados em consideração os comerciais veiculados em canais infantis de TV, no qual a participação de crianças na audiência é igual ou superior a 50% ou 35% (critério adotado pelas empresas por meio de Compromisso Público). O estudo incluiu TVs aberta e por assinatura.