À moda da Heineken
Ao assumir o controle da operação de cerveja da Femsa, dona das marcas Kaiser e Bavaria, em 2010, a cervejaria de origem holandesa Heineken deu um grande passo em sua estratégia de expansão no mercado brasileiro. A companhia tinha desafios pela frente, como a consolidação do seu principal rótulo no ainda incipiente segmento premium, e a reconquista de espaço na categoria mainstream, principalmente com Kaiser, que no passado chegou a ser líder do setor, mas sem o poder de fogo equivalente ao dos concorrentes Ambev, Brasil Kirin (que comprou a Schincariol em 2011) e o Grupo Petrópolis.
Passados cinco anos, os resultados agradam à matriz e a subsidiária brasileira cresce em importância e recebe maiores investimentos para se desenvolver (está aplicando R$ 1,2 bilhão na construção de uma fábrica em Goiás e na reforma de ou- tras duas plantas em Ponta Grossa e Jacareí). O Brasil era, em 2010, o 17o mercado da multinacional no mundo e, atualmente, é o quinto. No ano passado, a Heineken Brasil ultrapassou a nipo-brasileira Brasil Kirin e assumiu a terceira colocação com 9,4% de participação (contra 8,3%), atrás de Ambev (67,4) e Petrópolis (12,9%), segundo dados mais recentes da Nielsen. Demais companhias somam 1,9%.
A marca Heineken se consolidou como líder da faixa premium (com participação entre 17% e 25%, dependendo da região) e Kaiser se tornou a quarta marca da cervejaria em volume no mundo, atrás de Heineken, da mexicana Tecate e da também holandesa Amstel. A marca local também atingiu em 2015 sua maior participação de mercado no Brasil desde que foi comprada pela Heineken — a companhia não informa o valor.
“Era um cenário bem desafiador. O segmento premium, no qual Heineken é forte, era só 3%. Hoje, é quase 7%, enquanto a média mundial é 16%. Não tínhamos comercial na TV e as pessoas não sabiam falar o nome. O paladar do consumidor também era desafiador. O brasileiro é acostumado à cerveja mais leve. Com um investimento em marketing de 10% da média da categoria, não conseguiríamos construir marca no modelo tradicional”, recorda Daniela Cachich, vice-presidente de marketing da Heineken Brasil.
Experiência
Aproveitando o momento de descoberta de novos sabores de cerveja pelo público brasileiro, com o surgimento de vários rótulos artesanais, a companhia seguiu a estratégia de não explorar mulher, praia e sol na comunicação, e preferiu apostar em experiências e em conteúdo, especial- mente no ambiente digital. Projetos sazonais como o Glass Room e Up On the Roof (que em sua terceira edição estará aberto até 28 de fevereiro no Mirante do Vale, em São Paulo) ou a comercialização de chope e não de latas em festivais como o Rock in Rio são exemplos da política da companhia.
“Estamos menos na ótica de 30 segundos e mais na história que queremos contar. Nosso papel é de curador de conteúdo. Colocamos a audiência no centro. As pessoas querem estar nos eventos não pela marca, mas pela experiência. Vender latinha é mais fácil. Fizemos um investimento alto com 15 quilômetros de tubulação para vender chope no Rock in Rio, mas isso mostra o jeito Heineken de fazer, e estamos crescendo dois dígitos desde 2010”, aponta Daniela, sem abrir os resultados financeiros da companhia.
Além do Rock in Rio, evento do qual já participou em três edições (2011, 2013 e
2015) com a marca Heineken, a cervejaria é parceira do Festival Sónar (com a cerveja com tequila Desperados), do Popload e Popload Gig (com Heineken) e do Ri- beirão Country Fest (Bavaria). Além disso, a empresa é patrocinadora de shows outdoor promovidos pelaTime For Fun (T4F) — os mais recentes foram os das bandas Pearl Jam e Muse.
Segmentação
Com um portfólio global de mais de 250 rótulos, a Heineken adotou uma estratégia cautelosa para composição do mix de produtos no mercado brasileiro. Nos últimos quatro anos, foram quatro lançamentos para atender públicos e mercados distintos, o que ajudou a companhia a assumir a terceira posição no ranking das cervejarias. O primeiro deles, em 2012, foi a francesa Desperados (é líder de vendas naquele país na faixa de 18 a 24 anos entre todas as bebidas alcoólicas). Já no segmento cerveja com suco de fruta, a multinacional apresentou em 2013 o conceito Radler, presente em 45 países, sempre em associação com uma marca local. No País, o produto virou Kaiser Radler e conta com duas variantes, limão e tangerina — lançada em novembro de 2015.
“No Brasil, a cerveja tem 60% de penetração. A proposta fala com quem não gosta tanto de cerveja e traz pessoas que não costumam consumir. O produto agre- gou atributos de inovação e trouxe jo- vens de ambos os sexos. Tem intersecção com o público de cerveja, mas o perfil é diferente. Em Florianópolis, Radler tem mais representatividade que Kaiser, por exemplo. São apostas. Testamos alguns sabores, e outros podem vir ao longo dos anos”, projeta Daniela. As vendas do produto estão incluídas no share de cerveja da companhia.
Nas categorias tradicionais, a Sol, descontinuada em 2013 no segmento mainstream, voltou um ano depois posicionada na categoria premium com a campanha “Espíritu Libre”. Já no mainstream, a companhia investiu na regionalidade das marcas. Após testes com a holandesa Amstel e a portuguesa Sagres, a companhia optou por centrar esforços na primeira e posicioná-la para disputar espaço com as líderes de mercado no eixo Rio–São Paulo. “Rio de Janeiro e São Paulo concentram 21% do volume de cerveja do Brasil e Bavaria e Kaiser não estão (as marcas são comercializadas nas regiões, mas não recebem investimentos de marke- ting). Amstel tem aspiracionalidade por ser europeia, e surgiu essa oportunidade de posicioná-la como mainstream. São apenas seis meses, mas os resultados são expressivos”, conta Daniela. Cerveja oficial do Maracanã e do Circo Voador, no Rio, Amstel já tem mais sha- re que Bohemia, em São Paulo, e que Skol Beats, no Rio, segundo a executiva. Dentro do desenho do portfólio, Ba- varia se manteve como uma marca econômica, baseada na plataforma sertaneja, enquanto Kaiser fortaleceu a regionalidade, se destacando em Belo Horizonte, Curitiba, Blumenau, Porto Ale- gre, Ribeirão Preto, Fortaleza e Teres na. O volume de Kaiser, por exemplo, cresceu 3,3% até novembro de 2015 em comparação com o mesmo período de 2014. No mesmo período, o mercado como um todo teve retração de 1,9%. “Continuamos onde as marcas tinham potencial e equity. São marcas mainstream regionais”, analisa.
(Meio&Mensagem 01/02/2016)